Internet na veia

Por Tamara Mekhitarian 

Um artigo publicado em 2011 na Folha de São Paulo, “Profeta do iPocalipse”, discorre sobre os efeitos do uso da internet no nosso cérebro e capacidade analítica. O texto nos apresenta diferentes pontos de vista, seja ele mais pessimista como o do jornalista americano Nicholas Carr, ou mais otimista como o da neurocientista Suzana Herculano-Houzel.

De acordo com Carr, os usuários da internet demonstram menor aptidão para formular reflexões críticas, permanecendo numa superfície rasa de compreensão do conteúdo em questão. Pelo fato do meio digital ser por excelência um ambiente dinâmico, difuso e com um enorme bombardeio de informações, o cérebro humano é incapaz, em sua estrutura, de memorizar todo o conteúdo visto, pois são tantos estímulos ao mesmo tempo que acabamos não apreendendo nada de fato.

Já para Suzana, a abundância de informações presentes na web contribui para uma leitura mais completa. Em suas palavras: “Dizer que o aproveitamento do conhecimento é superficial na internet é uma visão muito enviesada. Seria preciso perguntar a essas pessoas quanto elas aprenderam sobre os conteúdos pesquisados nos links que visitaram. A riqueza de informações associadas ao conteúdo estudado torna a experiência de leitura na web muito mais profunda do que superficial.”

Um outro pesquisador citado no texto, Martín Cammarota, vê a web como um sintoma da nossa sociedade líquida e não como a origem do problema da incessante velocidade da nossa cultura. Ele acredita que a questão central é no modo como utilizamos a internet, e dá um exemplo de que se você acessa o Google para realizar uma pesquisa e se satisfaz com o conteúdo da Wikipedia ao invés de se aprofundar em livros, o problema é seu, não da web. Mas para mim, isso se vale a nós, que quando crianças ainda não tínhamos esse contato exagerado e avançado uso da internet. E as pessoas que são crianças hoje? Elas já nasceram nesse contexto digital. No meu círculo de convivência só vejo cada vez mais meninas e meninos imersos, separadamente, em seus iPads e afins. Uma criança de dois anos já sabe achar um vídeo no tablet e dar play/pause. Um bebê olha uma fotografia na revista impressa e desliza o dedo porque acha que virá a próxima. Talvez essas crianças desenvolvam quando adultos outras habilidades que nós não temos, mas por enquanto o que vejo é uma infância desprovida de brincadeiras mais primárias, contato com livros, contações de histórias e experiências culturais diversas. E essas atividades são fundamentais para a formação de um adulto consciente e questionador.

Acredito que a rede tenha um enorme potencial num sentido positivo, mas ainda não sabemos explorá-la direito. Estamos num processo de descobrimento do que ela capaz, é difícil analisar um fenômeno tão novo, suas possibilidades ainda não foram muito bem utilizadas. Discordo que Nicholas Carr tenha uma visão apocalíptica, nossa leitura está sim cada vez mais descentrada, eu mesma quando vou ler um livro ou texto mais complexo, desligo o iPhone porque esse aparelho é realmente viciante. É impossível para o nosso cérebro assimilar profundamente um conteúdo se no momento de sua aquisição estamos dispersos com outros assuntos. A internet causa uma ansiedade imensa, estamos viciados na novidade, temos a sensação de que em uma hora longe da web perdemos alguma coisa que está acontecendo no mundo. Recentemente realizou-se um estudo com alunos em uma sala de aula, em que deveriam deixar seus smartphones para fora enquanto estivessem na sala. Ao final, todos demonstraram os mesmos sintomas de abstinência de drogas. Preocupante, não? Haja autocontrole para não deixar-se levar pela procrastinação na internet e acabar prejudicando nossa competência de leitura crítica e profunda.

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